Por que Aécio Neves e Temer não foram condenados?

13 Jul, 2017 15:22:42 - Brasil

Brasília (DF)

A notícia da sentença de condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá deixou muita gente confusa nas redes sociais.

Logo depois que a decisão do juiz Sérgio Moro veio a público, o assunto mais comentado no Twitter era "Lula", seguido de perto por "Aécio e Temer".

Alguns usuários questionaram a "Justiça seletiva" que havia condenado Lula, mas que nada fez em relação ao presidente Michel Temer e ao senador Aécio Neves.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) Roberto Veloso, em entrevista ao HuffPost Brasil, chama atenção para três pontos que explicam por que Aécio e Temer não foram condenados e Lula sim.

1. Foro Privilegiado

"Como o próprio nome já diz, é um privilégio para poucos. No Supremo Tribunal Federal são processados e julgados o presidente da República, os deputados e senadores, os ministros de estados e os ministros de tribunais superiores", defende Veloso.

Autoridades públicas em geral têm direito ao foro privilegiado se recorrerem. O grande "privilégio" deste instrumento é o de que quanto mais alto for o cargo que a pessoa pública ocupar, mais alta será a hierarquia do tribunal que a julgará. Por isso, ocupantes de função pública em nível nacional, como o senador Aécio Neves e o presidente Michel Temer, só poderão ser julgados pelo STF.

Como Lula é ex-presidente e não tem foro, ele foi condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, nesta quarta-feira (12). Ele deve recorrer da decisão.

Em 2016, Dilma Rousseff chegou a nomear Lula como seu ministro da Casa Civil. Mas a nomeação foi suspensa. Caso ele tivesse permanecido no cargo, ele teria direito ao foro.

Em março do mesmo ano, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, determinou que Moro enviasse para o STF as investigações da Operação Lava Jato que envolviam o ex-presidente.

Teoria levou em consideração o argumento de então da Advocacia-Geral da União de que houve irregularidades na divulgação de interceptações telefônicas que envolviam a presidente Dilma Rousseff.

Após a movimentação, as investigações sobre Lula retornaram para o juiz Sergio Moro por decisão também do ministro Teori. Na época, ele remeteu à primeira instância a ação em que Lula foi condenado hoje, sobre o tríplex do Guarujá.

Na mesma decisão, Teori anulou a escuta telefônica em que Lula e Dilma Rousseff, então presidente, discutiam os trâmites para que o petista assumisse a Casa Civil.

Após ser duramente criticado por ministros do STF, o juiz Sérgio Moro pediu desculpas por ter divulgado o telefonema entre os políticos.

"Diante da controvérsia decorrente do levantamento do sigilo e da decisão de Vossa Excelência, compreendo que o entendimento então adotado possa ser considerado incorreto, ou mesmo sendo correto, possa ter trazido polêmicas e constrangimentos desnecessários. Jamais foi a intenção deste julgador, ao proferir a aludida decisão de 16 de março, provocar tais efeitos e, por eles, solicito desde logo respeitosas escusas a este Egrégio Supremo Tribunal Federal", disse Moro.

2. Denúncia contra Temer na Câmara dos Deputados

Na última segunda-feira (10), a denúncia contra o presidente Michel Temer, por crime de corrupção passiva, começou a ser analisada na Câmara dos Deputados.

O relator do processo na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara, Sergio Zveiter (PMDB-RJ), recomendou que a Câmara dos Deputados aceite a denúncia que ele classificou como "grave".

Roberto Veloso, da Ajufe, explica que o Temer só poderá ser julgado pelo STF se a Câmara dos Deputados autorizar o processo.

O peemedebista, desde então, começou uma movimentação para conseguir votos dos deputados a seu favor.

Ele articulou com partidos da base aliada trocas dos membros da Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. O colegiado retomou nesta quarta-feira (12) as discussões sobre o tema.

Temer precisa de 34 votos para garantir uma vitória. Independentemente do resultado, o texto será votado no plenário, mas um placar a favor do presidente na CCJ pode ajudar a repetir o resultado na votação com todos os 513 deputados.

3. Mas e o Aécio?

"Como senador, o Aécio tem foro privilegiado no Supremo. Ele está sendo julgado no STF. O processo dele ainda não terminou, ainda continua. Apenas o ministro Marco Aurélio Mello determinou que ele retornasse ao mandato. Ele não foi absolvido", explica Roberto Veloso, da Ajufe.

Aécio Neves é investigado em diversos inquéritos que envolvem corrupção e propina. O procurador- Geral da República Rodrigo Janot chegou a pedir a prisão preventiva do político, com base nas delações da JBS, mas o ministro Marco Aurélio também negou.

Em maio, o senador foi afastado do cargo, quando as informações da delação da JBS se tornaram públicas. Os partidos Rede e PSOL pediram a cassação do mandato de Aécio por quebra de decoro parlamentar.

Em junho, porém, o pedido de cassação de Aécio foi arquivado pelo senador João Alberto Souza (PMDB-MA), presidente do Conselho de Ética do Senado. O argumento do presidente foi de que "faltavam provas" contra Aécio.

Apesar de retomar o mandato e não ter sido preso, o político não foi absolvido das investigações, que seguem no STF.

A Justiça no Brasil

Em entrevista ao HuffPost Brasil, a advogada criminalista Carolina Fonti explicou o funcionamento da Justiça do País. A Justiça brasileira possui quatro instâncias e o STF é a última delas.

A 1ª instância é responsável por julgar cidadãos comuns por juízes em seções ou vara, espalhados pelas diversas comarcas do País. A 2ª instância julga casos em tribunais por desembargadores, seja o Tribunal Regional Federal (TRF) ou o Tribunal de Justiça (TJ). Na 3ª instância, a responsabilidade é do Superior Tribunal de Justiça (STJ). E só depois está a Corte do STF.

Leia a íntegra:

HuffPost Brasil: O ex-presidente Lula foi condenado em 1ª instância e deve recorrer. Como funciona o devido processo legal?

Carolina Fonti: Tanto os réus condenados quanto a acusação (Ministério Público Federal) terão o prazo de 5 dias para apresentar apelação contra a sentença do juiz Moro. Após apresentados os recursos, defesa e acusação também terão a oportunidade de contrapor argumentos aos recursos da parte contrária. O caso é então remetido à instância superior, nesse caso o Tribunal Regional Federal da 4ª região, em que três desembargadores julgarão o caso, decidindo se mantém a sentença ou a modificam.

Quais serão os próximos passos da defesa do petista?

Apresentação de recursos contra os fundamentos da sentença condenatória.

Qual a diferença entre a condenação em 1º instância e em 2ª instância?

A condenação em 1ª instância é feita com a sentença de um único juiz do caso (Dr. Sérgio Moro), que conduziu todas as audiências, acompanhou todas as provas juntadas nos autos, ouviu as testemunhas e interrogou os réus. A condenação em 2ª instância, se houver recurso dela, ainda não é a decisão definitiva. Porém, com a alteração do entendimento do STF, o tribunal poderá desde logo determinar que o réu comece o cumprimento da pena (por exemplo, recolher-se à prisão e pagar a multa imposta).

Quanto tempo pode durar o processo?

Não há um prazo determinado, mas estima-se aproximadamente quatro ou cinco anos até a apreciação do STF sobre o caso.

Com a condenação em 1ª instância, Lula se torna inelegível?

Já existia, por força da Constituição Federal e da Lei de Inelegibilidades, a possibilidade de alguém ter seus direitos políticos suspensos ou perdidos (incluindo a possibilidade de se eleger) nos casos de condenação criminal com trânsito em julgado. A lei da Ficha Limpa modificou isso dizendo que se tornam inelegíveis, dentre outros casos, "os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado".

O juiz Sergio Moro, é um julgador singular (é apenas um juiz que decide o resultado da ação penal). Assim, Lula não se tornaria inelegível agora. Quando as apelações forem julgadas pelo TRF4, um órgão colegiado (quer dizer, 3 desembargadores) decidirão sobre o caso. Aí então se discutirá a possibilidade do Lula se tornar inelegível.

Eu digo "discutirá a possibilidade", pois há uma divergência sobre esse ponto da Lei Ficha Limpa. Alguns entendem que seria necessário o trânsito em julgado (ou seja, o esgotamento de todas as instâncias, até o STF, sem possibilidade de recurso) para a condenação implicar em inelegibilidade. Assim, a confirmação da condenação por órgão colegiado em segunda instância não seria suficiente. Para essa corrente, o texto legal estaria se referindo a condenações por órgão colegiado em processos originários. Explico: um prefeito, por exemplo, tem foro privilegiado que determina que ele seja julgado pelo Tribunal de Justiça, que já será um órgão colegiado, sem passar antes por um juiz singular. Se ele for condenado por esse tribunal, já seria inelegível. Outra corrente diz que não: o Lula, por exemplo, se recorrer e a condenação for confirmada pelo órgão colegiado do TRF4, ele já se tornará inelegível.

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REDAÇÃO JINEWS
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