Ação da Cidadania recorre de despejo na Justiça Federal
Rio de Janeiro (RJ)
Com apoio da Comissão de Advocacia Pro Bono (CPB) da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Rio de Janeiro (OAB-RJ), a organização não governamental (ONG) Ação da Cidadania, criada em 1993 pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, entrou hoje (14) com ação na Justiça Federal. O objetivo, disse à Agência Brasil o diretor executivo da ONG, Rodrigo Kiko Afonso, é interromper o processo de despejo da organização do Galpão Dom Pedro II, situado na zona portuária do Rio, mais conhecido como Galpão da Cidadania, que ocupa desde o ano 2000.
A ONG recebeu ordem de despejo no último dia 17 de maio, com 30 dias para deixar o Galpão da Cidadania. O prazo se encerra no próximo dia 17. A Secretaria Municipal de Cultura do Rio quer instalar no local o Museu da Escravidão. Ocorre que a Ação da Cidadania já tem pronto o projeto do Memorial da Diáspora Africana desde 2012, inclusive com parceiro estratégico para sua implantação, faltando apenas conseguir o termo de posse definitiva do espaço, necessário para o aporte de parceiros institucionais.
O processo com essa finalidade estava em sua última etapa na Secretaria de Patrimônio da União (SPU), em Brasília, quando a prefeitura carioca, por meio da Secretaria Municipal de Cultura, pediu ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) que o imóvel fosse cedido para a construção do Museu da Escravidão, disse Kiko Afonso. “Como a SPU é um órgão técnico, não político, ela simplesmente executou esse pedido e está colocando para a frente”.
Diálogo
Kiko Afonso lembrou que a Ação da Cidadania já investiu na reforma e manutenção do espaço cerca de R$ 15 milhões. Ele estranhou que agora, após a modernização da zona portuária, a prefeitura queira o galpão para construir um museu que “eles nem têm o projeto pronto, nem captaram nada, nem sabem como vão fazer”. Grupo de trabalho da prefeitura para elaboração do projeto do museu está sendo formado. “O projeto só vai começar a ser construído em três anos”, disse Kiko. Na sua avaliação, este é um processo “absurdo e arbitrário.” A construção do Memorial da Diáspora Africana consta do processo de tombamento da região portuária junto à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), indicou.
O diretor executivo da Ação da Cidadania acredita que há possibilidade de reverter a ação de despejo e retomar o diálogo com a prefeitura. ”A reversão é simples. É só a prefeitura dizer à SPU que não quer mais o espaço, porque aí se interrompe o pedido da cessão e, a partir daí, a Secretaria pode dar prosseguimento à cessão para a gente”. Reafirmou que técnica e juridicamente, a ONG está pronta para receber isso. O contrato de cessão para a Ação da Cidadania já está aprovado pela consultoria jurídica da SPU e pronto para ser assinado, informou.
A entrada da ação na Justiça vai, segundo o diretor da ONG, inviabilizar o projeto de todo mundo. “Porque é uma briga que vai se arrastar por anos, ninguém vai poder fazer nada estruturante para esse espaço, e a sociedade, mais uma vez, perde porque, por interesse pessoal de alguém, a gente não consegue realizar os projetos que tem para cá, tem parceiros prontos para investir, tem apoio, tem tudo”, argumentou.
Kiko Afonso disse que na atual crise que o Rio de Janeiro está vivendo, o poder público tem mais dificuldades de angariar recursos sozinho do que a sociedade civil. “É muito mais fácil a Ação da Cidadania envolver parceiros para construção de um museu como esse do que a prefeitura, que hoje não tem dinheiro para nada.” A petição on-line, criada em apoio à permanência da ONG no Galpão da Cidadania, já tem 2 mil assinaturas. Ela ficará aberta até que haja uma posição definitiva sobre o caso, disse Kiko Afonso.
Posicionamento
A Secretaria Municipal de Cultura informou à Agência Brasil, por meio de sua assessoria, que a questão envolvendo a Ação de Cidadania não compete a ela resolver. “O galpão onde eles estão instalados pertence ao governo federal, a quem cabe decidir a destinação do imóvel”.
Procurado pela Agência Brasil, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informou que por ocasião dos trabalhos de valorização do Cais do Valongo, ficou decidido que a região teria um Centro de Referência, conforme projeto de preservação desenvolvido. “O espaço pertence à SPU e o processo de destinação de seu uso enquanto Galpão da Cidadania já tramitava no órgão há dez anos, sem desfecho. Com a ideia de vir a prefeitura a implantar no Galpão o Museu da Escravidão e o seu pleito à SPU nesse sentido, o Iphan concordou que naquele espaço também ficasse inserido o Centro de Referência do Cais do Valongo. Na verdade, o Iphan só participa do processo em prol da criação do Centro de Referência do Cais”, esclareceu.
TEXTO/ VALÉRIA AGUIAR/ AGÊNCIA BRASIL